O desengasgo...
E quando percebi que se
aproximava o fim daquelas duas horas de nó e engasgo de um propósito ainda não
identificado...as letras se embaralharam sem nitidez e o foco se tornou
múltiplo. Havia chegado o fim. E a única atitude que consegui tomar foi ir num passo
ao banheiro, controlar as lagrimas que pulavam abusadas por dentro dos óculos
embaçados, esperar inquieta a minha vez, entrar em um pé e trancar noutro a
trava de segurança do distanciamento do mundo. Era tudo que eu precisava. Me
aproximar de mim e viver aquela dor doída que eu ainda não sabia identificar a
origem. Precisava acessar alguma vida anterior...ou talvez ela já estivesse
desperta em minha vida presente mas minha consciência esmagava meu peito e
apertava cada vez mais minha garganta.
Chorei.
Chorei como nem sei. Como uma
criança que perde seu cão, seu primeiro amor.
Como uma adolescente que desabrocha sua primeira decepção, como uma mulher
que se dá conta de que ainda não se achou.
Um choro mudo, sem um único
ruído. Em câmera lenta, desfrutando cada contração muscular facial. Um choro de
encontro e saudade. Um rompimento e renascimento.
Sentei dentro daquela cabine
pública e chorei a minha maior privacidade privada.
Percebi ao absorver a
história daquela mulher, que existe um monte de mim que ainda me é
inacessível...intocável. E foi justamente essa parte que chorou! Não a parte
que acha que se conhece, se supre, se ouve, se basta. A parte que ainda dorme. Que
acordou hoje.
Foi assolada por um conto de
uma vida real, por uma semelhança de um desconhecido comum exemplificando minha
maior ausência diante da minha presença.
Livre.
Foi tudo que não senti ao
sair daquela caixa iluminada, mas pelo contrario senti que a maior parte de
mim se esconde atrás de alguém que ainda nem sei quem é. Alguém que almejo ser
sem saber. Alguém que admiro sem saber ainda porquê.
Sai suspensa, intensa,
imensa, sem sentir meus pés no chão e minha visão ao redor. Com o foco alargado
e ao mesmo tempo irreal.
Vaguei pela rua respirando o
ar rarefeito que se formou a partir de todos os entãos sem saber ainda quantos
porquês serão necessários para tentar minimamente começar a caminhar na direção
desse alguém que descobri que existe.
A metade livre que se basta
dentro de mim.
( )