24 dezembro 2010

..de pilha.

..a janela estava aberta, e isso era raro pois a poeira da obra da fachada irritava suas narinas desprovidas de filtros à prova de poeira-fina.
mas o sol estava tão tentador...depois de uma semana de frio, chuva e ausência de luz natural...que a janela se abriu com o consolo de receber, em meio à poeira dos operários desajustados, um foco de brisa...uma faísca de vento...um facho de aquecimento.
em meio ao som ensurdecedor de repiques de martelos, agudos de britadeiras, chacoalhar de pedras soltas caídas ao chão...vinha um som...um som familiar e um tanto quanto desconhecido...um som apropriado de esquecimento conduzido...um som agradável aos seus ouvidos...som bom...só...som.
uma sanfona talvez...tons próximos...palavras frescas...secas...descascadas.
ela arriscou olhar pela janela para procurar de onde vinha aquele som...e, ironicamente, vinha da mesma origem sonoro-poluidora dos operários inoportunos...um radinho de pilha...de pilha.
em meio a toda aquela desordem de gesso, massa e entulhos...parecia que se formava uma serenata para aquela janela...
lixos e retalhos compunham aquele cenário já não mais desconhecido...
era sim...uma serenata...em plena luz do dia...e do calor abafado...e da ausência de músicos e poetas...
só ela e o radinho de pilha...eles se bastavam...
apoiou os cotovelos ressecados no peitoril empoeirado...e contemplou o seu presente imposto pela sua própria imaginação manipuladora. ( )

Um comentário:

Anônimo disse...

só assim o poeta era feliz...
só assim a poesia valia a pena...
só assim...
"O amor que eu sinto só"
o poeta se realizou em um instante pequeno num radinho de pilha..]vou ouvido num instante...num mero e passageiro instante!
Ruba